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Foto do escritorAndré Luis Coutinho

Hypnotic: Ameaça invisível | Robert Rodriguez brinca com a farsa em novo “filme de herói”


Para começar este texto, quero que você que está lendo lembre da introdução de X-Men: O Confronto Final. O Professor Xavier e Magneto estão visitando uma jovem Jean Grey para que ela mostre seus poderes telecinéticos aos dois mentores, um flashback que servirá de prenúncio para a real ameaça que se instaurará progressivamente no dito filme de 2006. Puxei este exemplo justamente porque esse é o padrão expositivo que os filmes de super-heróis adotam desde sua ascensão nos anos 2000 à sua era dourada durante o Universo Cinematográfico Marvel. Conhecemos o personagem antes de sabermos qualquer coisa sobre seu poder – e ainda assim, seu poder apenas afeta quem está dentro do universo do filme.


Já Hypnotic, o novo filme do ótimo Robert Rodriguez, não se satisfaz com isso. Afinal, a habilidade sobre-humana aqui afeta não só aqueles que estão dentro da tela como também a própria estrutura e abordagem formal do filme, consequentemente alcançando a nós, o público. E nós, por outro lado, não temos total consciência disso e começamos em uma premissa digna de um filme de ação protagonizado por Liam Neeson, em que o policial vivido por Ben Affleck procura sua filha que foi misteriosamente sequestrada enquanto investiga um misterioso homem que tenta assaltar um banco e que pode estar ligado ao desaparecimento da criança. E sim, não demora muito para o elemento sobrenatural dar as caras na presença do antagonista vivido pelo sempre surtado William Fichtner e na consultora do caso encarnada por Alice Braga. E é claro que, seguindo uma linha próxima a A Origem, Rodriguez conta com inúmeros diálogos expositivos que funcionam como um estabelecimento de regras meio bobo.


Na verdade, toda essa primeira metade do filme surge péssima, com uma fotografia monocromática artificial, conveniências narrativas ridículas, batidas clichês como o par romântico que se forma com base em absolutamente nada além de uma parceria momentânea... Mas é aí que descobrimos a brincadeira de Rodriguez, que serve não apenas para pregar peças no espectador, mas também para revelar uma “nova” forma de abordar personagens a partir de seus superpoderes. (E a partir daqui, creio que precisarei compartilhar certos detalhes da trama que podem conter spoilers pesados, então continue por sua conta e risco.)


Há um elemento aqui que lembra muito o que Drew Goddard havia feito em seu divertidíssimo O Segredo da Cabana de 2011. Se aquele filme partia de uma premissa de terror boba, genérica e formulaica justamente para demonstrar como sabia manipular e brincar com essas fórmulas, esse aqui faz o mesmo com o thriller e o cinema de ação B. Se em um filme desse tipo, uma central de polícia surgiria completamente vazia por puro corte de gastos – o que não teria nenhuma lógica intra-filme – aqui ela engana o público justamente porque o protagonista está sendo enganado, está vivendo seu próprio thriller B. E de deboche com filme B, Rodriguez entende como ninguém. Basta conferir Um Drink no Inferno, Planeta Terror, Machete e todos os seus filmes infanto-juvenis. E, ao seu desfecho, parece fazer o mesmo com o cinema de super-heróis, incluindo uma cena pós-créditos com MAIS UM twist que promete um segundo filme (que provavelmente não existirá devido ao fracasso comercial que o filme enfrentou).


Não deixa de ser irônico então que descubramos que toda a primeira parte não passou de uma ilusão, de uma farsa, de um... filme dentro de um filme, por que não?! E que o filme real na verdade fale sobre uma organização secreta e vilanesca formada por telepatas e que o próprio protagonista é o “sequestrador” de sua filha super-poderosa, não deixa de ser uma reviravolta eficiente como também é absurda o suficiente para respeitar a natureza de uma narrativa que conta com esse tipo de personagem.


Espera... Então Hypnotic é um filme que só funciona por causa de seu plot twist? Não! É puramente um exercício de gênero, uma abordagem super frontal que usa do twist para comentar quase de forma metalinguística sobre o cinema de heróis e os thrillers B que lançam aos montes desde os anos 1980 (os twists são parte dessa metalinguagem). E além disso, ainda é um interessante filme de origem de super-heróis desafixados das grandes Marvel e DC. Uma pena que não vai virar uma franquia, gostaria de ver quais cartas na manga o Rei da Reprodutibilidade B ofereceria para uma franquia de super-heróis “sombrios e realistas”.

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