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Foto do escritorAndré Luis Coutinho

O exorcista - O devoto: a marca do clássico eleva mais um filme comum sobre possessão demoníaca


 

Chega a ser redundante falar qualquer coisa sobre O Exorcista original de William Friedkin, lançado em 1973. Mas ainda posso dizer sem medo de ser acusado de hipérbole que não apenas é um dos maiores filmes de terror da História como também um dos maiores exemplares da Sétima Arte desde sua gênese. O trabalho de Friedkin até hoje vem sendo objeto de estudos de Cinema, seja pela forma como compõe a atmosfera insalubre que toma conta da família MacNeil, seja pela habilidade ao equilibrar o horror da possessão da menina Regan com o drama da crise de fé protagonizada pelo Padre Karras. E desde esse clássico absoluto, todas as tentativas de gerar uma franquia acabaram fracassando tanto em crítica quanto em público.


Quando parecia que Hollywood havia deixado de lado essa ideia de construir uma franquia com base na obra-prima de 1973, surge David Gordon Green que, ultimamente, tem atuado como uma espécie de “reanimador” de franquias clássicas em sequências recentes, o que também fez com Halloween ao desconsiderar todas as infindáveis sequências para conceber uma “mais definitiva” em 2018, gerando assim uma trilogia com o razoável Halloween Kills e o péssimo Halloween Ends. E sua proposta com O Exorcista: O Devoto não se difere muito disso já que, também visando mais dois filmes futuramente, este desconsidera as outras entradas que foram lançadas ao longo dos anos, incluindo a recente série de Jeremy Slater.


 Partindo de uma premissa que lembra vagamente Os Suspeitos de Denis Villeneuve e que gera um thriller razoavelmente eficiente que ocupa quase um terço da projeção, Gordon Green não parece saber exatamente o que quer fazer com esse seu mais novo projeto, algo que também senti no último capítulo da série protagonizada por Michael Myers. Quando sai do thriller investigativo sobre o paradeiro das duas garotas centrais, o longa torna-se quase um remake de sua base clássica, só que bem mais limitado tanto no aspecto dramático quanto no assustador/incômodo. No caso do terror, é construído com certo desinteresse e abusando de tendências recorrentes como sustos fáceis e uma edição propositalmente perturbada que vez ou outra surge fora de hora. Gosto pelo menos de como o diretor tenta evocar o filme original a partir de sua composição de luzes e sombras, como no caso da névoa opaca e um tanto tóxica que permeia o ambiente habitado pelas meninas.


 Já o drama é bem precário em seu tratamento, especialmente quando Gordon Green apela para discursosconciliadores longos e vazios que parecem mais uma fusão anabolizada de frases prontas de para-choque de caminhãoque surgiriam de filmes pregatórios como Deus Não Está Morto – e a personagem de Ann Dowd infelizmente é posta aqui puramente para esse fator. Tudo para empurrar a progressão do arco de ceticismo do protagonista vivido pelo sempre esforçado Leslie Odom Jr. que, infelizmente, tem seu potencial interpretativo desperdiçado pela pobreza temática e narrativa que Gordon Green acaba oferecendo ao projeto. E a comparação com o conflito do Padre Karras do original é inevitável, já que este novo projeto constantemente pede para ser igualado ao original, desde sua estrutura aos seus dramas e a algumas de suas técnicas, como apontado acima.


   Portanto, O Exorcista: O Devoto me parece mais um filme de possessão perdido em um cenário de terror povoado por incontáveis longas iguais a ele que, apenas por acaso, conta com a grife de Friedkin em seu título. Não é um projeto particularmente interessante em nenhum sentido e, até mesmo quando tenta homenagear o original, o faz de forma tão desinteressada que até ver os rostos de Ellen Burstyn e Linda Blair acaba se tornando algo banal, trivial, sem qualquer peso ou impacto narrativo. O desfecho até caminha por um território corajoso, mas toda a estrada que leva a esse território soa tão acomodada e preguiçosa que o filme se torna esquecível em pouquíssimas horas após a sessão. Mas temos ainda dois filmes pela frente e a esperança de que Gordon Green irá parar de requentar franquias clássicas por motivos caça-níqueis e conceber suas próprias. Talvez o resultado seja melhor!

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