Histórias distópicas existem há muito tempo, desde aquelas que retratam uma sociedade tomada por políticas absurdas, ditaduras violentas e repressivas ou assolada por desastres naturais que mudam drasticamente o cenário do mundo, porém, todas essas histórias giram em torno de uma coisa: o conceito de humanidade. O ser humano sempre foi o centro do ato de se contar uma história, e as relações perante nossos iguais serviam de combustível para o poder crítico dessas histórias, relações essas que podemos caracteriza-las como peças fundamentais da luta de classes que constrói a sociedade moderna, uma caracterização que é representada de forma brilhante em, do diretor sul-coreano Um Tae-hwa.
Depois de um terremoto apocalíptico, um condomínio é o único prédio ainda de pé na capital Seul, em um cenário completamente devastado e inóspito, os residentes lidam com diversas moralidades e conflitos em relação a diversas questões que chegam a essa pequena sociedade junto da desordem que acompanha o caos do desastre. É a partir disso que o diretor discursa como a propriedade privada prevalece até mesmo nos momentos de desordem, os moradores do condômino dão origem a uma comunidade isolada do resto dos sobreviventes, um reflexo puro de uma sociedade historicamente construída com base em segregações violentas.
Ao início, Tae-hwa retrata esse processo de adaptação de uma maneira meio cômica, a cena da primeira reunião de condomínio diz muito isso, onde a trilha sonora se torna leve perante a discussão que se forma pela cena, sendo esse debate redigido de forma descontraída, sem muito senso de urgência ou seriedade. Tudo isso para que, conforme a narrativa progride, essa proposta leve dá lugar a uma trama que retrata de forma violenta a maneira como essa sociedade do condomínio ascende, crescendo não só as tensões com os grupos remanescentes do lado de fora, mas também as desavenças entre os membros dentro do complexo isolado, que dão origem ao melhor potencial dramático do longa.
Sobreviventes: Depois do Terremoto organiza muito bem a criação de seu mundo distópico, além de promover uma discussão interessante, da melhor maneira que uma ficção pode fazer, sobre as políticas de segregação social que o capitalismo proporciona, até mesmo quando o mundo acaba, a propriedade privada e a sede de poder predominam sobre a noção de humanidade. Não podemos ser humanos quando se temos a noção de competição e individualismo que a sociedade atual impõe sobre seus residentes.
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