Admito que cinebiografias atualmente me dão um pouco de preguiça. Afinal, o subgênero cada vez mais se vê pasteurizado e formulaico a fim de agradar apenas pela importância do/a biografado/a e, no fim, acaba virando um conjunto de encenações desinteressantes de informações que seriam encontradas facilmente em qualquer pesquisa no Google. Poucas são as cinebiografias que funcionam como Cinema de fato.
Tesla, por sua vez, consegue ser diferente. Porém, o traço particular que o diretor Michael Almereyda dá à sua obra nunca soa tão consistente como deveria e o filme acaba ficando numa linha tênue entre fórmula e inovação. Focando na relação conturbada entre o personagem-título e o inventor americano Thomas Edison, o filme é narrado por Anne Morgan - amante de Tesla e filha de seu maior investidor J.P. Morgan - numa perspectiva moderna, citando elementos anacrônicos como músicas de Bob Dylan ou até mesmo o Google, além de aparecer constantemente quebrando a quarta parede na posse de um MacBook (no mundo real, a mulher morreu em 1952).
É aí que entramos no lado mais distinto do trabalho de Almereyda, já que esse anacronismo foi um dos elementos que me pegaram desprevenido no filme e, por mais que à primeira vista eu tenha achado uma ideia estranha, logo caiu a ficha que narrar sobre um homem à frente de seu tempo como Nikola Tesla seria bem mais pertinente de um ponto de vista contemporâneo, a partir de invenções que o próprio ajudou a criar de forma indireta. E nada mais conveniente do que usar a mulher que esteve ao seu lado durante boa parte de sua vida mais ativa para contar essa história, com direito até a alguns deboches direcionados a Edison. A propósito, vale elogiar a performance charmosa, enigmática e fascinada da belíssima Eve Hewson nessa personagem "atemporal". Destaque também para a trilha de John Paesano, que acompanha essa lógica anacrônica ao, por exemplo, acompanhar uma celebridade do teatro da época com um pop eletrônico que facilmente seria ouvido em um desfile da Victoria's Secret.
Outro destaque é a fotografia de Sean Price Williams, em especial como trabalha com luzes, sombras e cores saturadas. Diferente da abordagem mais lavada e burocrática de boa parte das cinebiografias, Almereyda e Williams injetam bastante cor em seu filme, até mesmo tornando algumas cenas em uma experiência surreal, como aquele momento musical mais próximo do desfecho. Porém, vez ou outra, o sentimento que passa é que o interesse de Almereyda é simplesmente enfeitar seu filme ao invés de realmente transmitir algo com aquilo - e o momento musical citado acima foi o que mais me incomodou nesse sentido. Outro ponto negativo é que, tirando a abordagem anacrônica destacada no parágrafo anterior (realmente bem consistente), o resto da trama é encenado de forma formulaica e até apressada a ponto de não acompanharmos muito bem a passagem de tempo na vida do inventor europeu.
Liderado por uma boa performance introspectiva de Ethan Hawke, ator que sempre demonstra versatilidade ímpar, Tesla é um filme com elementos interessantes e momentos realmente muito bons, mas que não consegue sair tanto quanto pretendia da sombra das fórmulas cinebiográficas. Mas vale a assistida!
O filme estará disponível em vários cinemas do país na primeira edição do Festival Filmelier no Cinema! De 19 de abril a 14 de maio.
Assista ao trailer:
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